quinta-feira, 24 de maio de 2012

A história das Letras de musica , dentro do universo Rock and Roll

Parte 2

Dylan tem um filho cantor, Jakob. O líder dos Wallflowers, porém, está longe de ser o melhor exemplar de rebento intelectual. Este talvez seja Lewis Allan Reed, ou Lou Reed. Tanto no Velvet Underground - grupo apadrinhado pelo artista plástico Andy Warhol que dividia com outra boa cabeça do rock, John Cale - quanto na sua carreira solo, Reed atraiu atenção e escândalo porque se propôs a falar do lado selvagem da vida. Sua música mais famosa, aliás, Walk on The Wild Side, de 1972, habitava um universo de travestis e sexo oral. Tempos depois, num documentário sobre essa canção, David Byrne dizia se indagar a cada vez que ouvia pessoas cantarolando o refrão: "Será que elas sabem do que se fala?!"

Ainda a bordo do Velvet Underground, Reed havia feito polaróides da sujeira sob o tapete dos anos 60. Quando os Beatles decretaram ao final da década que o sonho tinha acabado, ele deve ter dado um sorrisinho sarcástico e dito "ah, é, não diga..." Em 1967, no famoso "disco da banana", cuja capa fora desenhada por Warhol, Reed falou desabridamente sobre drogas em Heroin, música que emulava a gangorra de excitação e prostração do vício. I'm Waiting for The Man tratava de prostituição e Venus in Furs, de sadomasoquismo: "Falem os chicotes, a cinta que espera por você/ Castigue-o minha senhora, para que seu coração seja curado"

O choque não era dado só pela temática pesada, pouco usual na música da época, mas pelo tratamento musical e poético. Havia um fascinante contraste entre a vida baixa retratada e a alta cultura do retrato. A derradeira faixa daquele LP, European Son, era um réquiem cacofônico para o poeta Delmore Schwartz, ex-professor de Reed na faculdade de artes e ciências de Syracuse que morrera de ataque cardíaco no ano anterior. Seu corpo ficara dias à espera de identificação num necrotério. O lado selvagem. No prefácio a Atravessar o Fogo, Reed reconhece: "Delmore Schwartz, meu professor, me apresentou à beleza da frase simples, e foi o que tentei seguir ao longo de uma vida escrevendo."

Na Inglaterra, entre muitos exemplos dessa elaborada oralidade, presente também nos beats ou em Dylan, está Steven Patrick Morrissey. Sua poética está enraizada em Lord Byron ou Mary Shelley, enquanto suas tiradas ácidas remetem a Oscar Wilde. Quando os Smiths acabaram, em 1987, Morrissey partiu para uma carreira solo de achados funcionais como "eu nunca pretendi matar/ eu não sou naturalmente mau/ fiz tais coisas/ apenas para me fazer/ mais atraente para você/ terei falhado?" (The Last of The Famous International Playboys).

Até a chegada da década de 1990, os garotos e garotas com maturidade intelectual para escrever boas letras de música tinham tido uma formação baseada em textos, não em imagens. Sua cultura ainda era basicamente literária, linear. Isso criava uma certa continuidade estética entre os poetas pré-rock'n'roll e as novas gerações, como no caso dos escritores de beats e de Dylan, ou Delmore Schwartz e de Reed. Porém, com a entrada em cena de letristas nascidos diante do aparelho de televisão, os versos passaram a funcionar quase como epigramas, reveladores de um estado de espírito mais inquieto que o polegar na tecla do controle remoto, em vez de constituir histórias com início, meio e fim.

A primeira cabeça representativa da turma da fragmentação foi a de Kurt Cobain, de Seattle, o líder do Nirvana que se suicidaria em 1994, no ponto mais baixo de uma espiral de drogadição e insegurança. Na biografia Come As You Are, de Michael Azerrad, são abundantes os testemunhos de como Cobain deixava para escrever as letras em cima da hora, num canto de estúdio. O seu desespero era transmitido pela alternância entre agitação e calmaria nos instrumentos do grupo, entre gritos e sussurros nas próprias cordas vocais. A letra era quase secundária, mas não desprezível, na sua arte.

Na época em que música Smells Like Teen Spirit explodiu na MTV americana, a emissora fez uma enquete entre seus espectadores: "O que diz a letra?" As pessoas ouviram as coisas mais disparatadas. Inclusive porque Cobain lhes oferecia, sim, imagens disparatadas, como "um mulato/ um albino/ um mosquito/ minha libido/ yeah". E assim, para seu terror, Cobain descobriu-se porta-voz de uma geração que achava não ter nada a dizer. O que nem era verdade: ela não tinha a dizer à moda antiga. Leia-se a tristíssima Pennyroyal Tea, ou "Chá de erva poejo", de supostas características abortivas. Nela, Cobain escreveu: "Sente-se e beba chá de poejo/ Destile a vida que está dentro de mim." Imagem forte e bonita.

Outros talentos burilaram a nova estética, à medida que a fragmentação audiovisual era radicalizada pela digital como fonte de educação sentimental da rapaziada. E o inglês Thom Yorke, do cultuado Radiohead, acabou herdando o bastão de intérprete das angústias geracionais após a morte de Cobain. Seu grande hit - agora raramente executado ao vivo - expressa de forma simples a inadequação da juventude. "Você flutua como uma pena/ Num mundo maravilhoso/ Eu queria ter sido especial/ Tão especial/ Mas eu sou um verme/ Eu sou esquisitão/ Que diabos faço aqui?/ Eu não pertenço a este lugar", avisa Creep.

Enfim caro leitor , aventure-se por esse universo .....

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