terça-feira, 12 de agosto de 2008

A Historia do Skate parte 2

Skatemaster Tate and The Concrete Crew - Do The Skate

Em 1991 o grupo skatemaster tate and the concrete crew (um dj, dois rappers e um guitarrista) criou um clássico: "do the skate", nome da primeira faixa do lp de mesmo nome. O álbum contava com algumas guitarras de tim kerr e backing vocals do grande natas kaupas. Antes disso skatemaster tate apareceu em duas compilações em fitas cassete da revista thrasher. No volume 6 com a música jolt skate mix e no ano de 1986 abrindo o volume 4 com skaterock rap. Estes angelenos estavam a frente do seu tempo quando resolveram fundir rap e skate.

O quarto volume das coletâneas da thrasher trazia uma seleção musical eclética, retratando o caminho que o skate estava seguindo. Com a incorporação de manobras do freestyle, o street style cresceu, as ruas foram tomadas por streeteiros, e nas ruas começava a se popularizar o hip hop, o funk e outros estilos musicais. Skatemaster tate foi o melhor retrato desta fase, que atingiu seu ápice no começo dos anos 90 quando os skatistas ouviam punk rock num lado de uma fita cassete e rap no outro.

M.i.a. - Tell Me Why

Eram poucas as informações sobre skate rock que chegavam aos ouvidos da molecada brasileira que andava de skate no final dos anos 80. Pode-se dizer que as informações eram "bimestrais" ou na melhor das hipóteses "mensais". Digo isso pois nossa única fonte eram as revistas especializadas da época. No brasil tinha a overall, a yeah! E a skatin'. Entre as gringas destaque total para a thrasher, é claro! Nas últimas páginas da revista sempre tinham resenhas e entrevistas com bandas interessantes ou publicidade de gravadora independente, além de colocar a venda lp's do j.f.a ou as super desejadas coletâneas da série skate rock que na época já estavam nos útimos volumes. Foi na thrasher que a gente soube que o dee dee tinha deixado os ramones ou que bad brains e suicidal tendencies estavam em grandes gravadoras. A sessão musical da thrasher era obrigatória, você não precisava comprar a revista mas sempre conferia nas bancas o que tinha naquelas páginas fabulosas.

Assim sendo classificávamos de modo grosseiro qualquer banda entrevistada na thrasher como "banda skate rock". Algumas bandas nem eram skate rock mas como tinham sido matéria da thrasher a gente classificava "sem medo" como tal.

Uma dessas bandas que não tinham muito a ver com o skate mas, por aparecer na thrasher acabou sendo colocada na mesma turminha foi uma obscura banda de las vegas chamada m.i.a.

Duraram de 1981 à 87. Integrante principal: mike conley. Registro fundamental: lost boys (2 lp's em 1 cd... Lançado em 2001 pela alternative tentacles). Os 2 lp's em questão são: "murder in a foreign place" de 1984 e "lost rites" de 1982. O último álbum: "after the fact" de 87, trazia frank daly e mark arnold que após o fim da banda formaram o big drill car.

Naquela fase da globalização do skate no começo dos anos 90 surgiu uma banda na suécia chamada millencolin. O nome da banda foi uma adaptação do nome da manobra melancholy, também conhecida por sad air. O quarteto tem model de tênis pela vans e construiu uma skate park em sua cidade natal orebro. Começaram a tocar ouvindo operation ivy, nofx e as bandas que enriqueciam a trilha sonora dos vídeos da marca h-street.

Sub Society

Uma pequena e obscura banda de san diego chamada sub society ficou um pouco conhecida por estar presente nas trilhas destes vídeos da h-street. Os registros fonográficos do grupo se resumem a uma demo tape e dois compactos 7 polegadas. Também pode se ouvir sub society no volume 10 da coleção de fitas cassete da revista thrasher e nos vídeos 'hokus pokus' e 'next generation' da h-street.uma sessão clássica do hokus pokus é de matt hensley apavorando com seu belo estilo e ao fundo a música "a whole lot less" do sub society. Inspirados nas imagens e na música o millencolin regravou "a whole lot less" .

O skate brasileiro entrou na década de 90 quase morto. Um dos culpados foi o bloqueio das contas bancárias do plano collor. Quem continuou intenso no skate é porque tinha o skate na veia. Nesta época o freestyle foi incorporado ao streetskate, novas manobras íam surgindo. Heels e flips eram manobras básicas. Uma evolução gigantesca. Um novo skate, rodas torneadas, shapes finos e bastante côncavos. Velocidade não importava tanto, tudo estava sendo reinventado, não havia espaços para veteranos ou old schools. Tarobinha um dos poucos "velocistas" da nova geração foi o campeão de streetskate de 1992. Tarobinha era o supra sumo de uma geração de streeteiros que raspavam a cabeça, usavam roupas extra large e adotavam uma postura quase anti-profissional, eram avessos à fotografias e tentavam ser undergrounds.nos anos posteriores o skate brasileiro se auto conheceu, se profissionalizou, valorizou-se. Época de excelentes nomes como digo, carlos de andrade piolho, rodil ferrugem e lincoln ueda. Bob foi capa da thrasher, o switchstance se popularizou.

Mas aquele difícil início de década ninguém esquece, assim como não esquecemos as músicas mais tocadas nos campeonatos da época. Uma banda que sempre embalava os streeteiros se chamava operation ivy. Quarteto de berkeley, safra gilman street 87/89. Elaboraram uma inovadora mistura de punk com ska, catalizaram o surgimento de um novo gênero musical.anos após o fim da banda o baixista matt e o guitarrista tim (lint) formaram o rancid. O baterista brett reed nas horas vagas anda de skate... É ele quem aparece andando no video da música hyena.

Gang green - Skate To Hell

A primeira aparição do gang green foi na clássica coletânea "this is boston not l.a." de 1982 ao lado de bandas como jerry's kids, f.u.'s, the freeze entre outras. Com apenas 15 anos de idade os moleques do gang green se destacaram entre a boston crew por fazerem um hardcore rápido e intenso. Boston era uma das mecas do hardcore americano no início dos 80 representada por grupos como mission of burma, ssd e dys.

A partir do meio daquela década (com lançamentos pelas gravadoras taang! E roadrunner) o gang green fez um hard rock rápido com letras sobre festas, garotas, cerveja e skate. Lançaram um álbum (inclusive no brasil) cujo título "older... (budweiser)" já dava o tom da conversa. Em outros registros várias músicas tendo o skate como tema (skate hate, skate all day, etc) os faziam ser os representantes bostonianos do skate rock. Ficaram imortalizados no gênero quando fecharam o volume 5 (wild riders of boards) das coletâneas da thrasher com a música skate to hell .

Steve alba começou sua história como skatista em 1974 aos 11 anos de idade e desde então nunca mais parou de andar. Em 78 entrou para a história ao vencer o primeiro campeonato realizado em uma piscina, terreno no qual é mestre. Mas o espírito aventureiro de salba (como é mais conhecido) sempre fala mais alto procurando terrenos inexplorados e pouco óbvios como fullpipes e piscinas remotas. Não foram poucos locais por ele descobertos. Também não foram poucos os secrets spots que só foram skateados pelo irmão mais velho da família alba.

No final dos anos 70 ao lado de outros skatistas da santa cruz como duane peters e steve olson ajudou a sedimentar a postura rebelde do skate. Sim! Salba também faz música, mas apenas como passatempo!!! A guitarra é uma de suas paixões. Seus outros hobbies são colecionar discos de 45 rpm e descobrir novas piscinas e pipes.Atualmente faz parte da banda powerflex 5 tocando um rockabilly competente. 

No meio dos anos 80 formou o hard punk rock screaming lord salba and his heavy friends. Apareceram em dois vídeos da santa cruz, em algumas coletâneas e fecharam um dos melhores volumes das compilações da thrasher.

Sidewalk Surfin'

Jan and Dean foi uma dupla vocal estado-unidense dos anos 60. Foram os primeiros grandes populizadores da surf music. Emplacaram hits como deadman's curve, i found a girl e surf city, esta última co-escrita com brian wilson dos beach boys. Outra parceria de brian com jan deu origem a primeira música sobre skate que se tem notícia: sidewalk surfin'.

Quando surgiu, o skate era chamado de sidewalk surfin' e era encarado apenas como mais uma moda passageira infanto-juvenil. A ingenuidade desta época seminal do skate pode ser conferida em um dos trechos da letra da música:

"grab your board and go sidewalk surfin' with me...
Don't be afraid to try the newest sport around
(bust your buns, bust your buns now)
It's catchin' on in every city and town
You can do the tricks the surfers do, just try a
"quasimodo" or "the coffin" too (why don't you)
Grab your board and go sidewalk surfin' with me.
(skateboard with me, why don't you skateboard me?)".

Regravada até mesmo por Dee Dee Ramone .

Mike Vallely

Mike Vallely é um brutamontes, esquisitão, é um cara que "dá medo" só de olhar. Mike Vallely é jogador de hockey, um esporte violento, além disso é lutador profissional de vale tudo. Mas é com o skate, a poesia e com o punk rock que ele consegue canalizar sua agressividade de forma mais saudável.

Já lançou dois livros de poemas. Produz seu próprio programa de televisão chamado drive tv. Mike Vallely é um dos skatistas mais importantes de sua geração. Nas ruas se consagrou como um dos streeteiros mais radicais de todos os tempos. É uma lenda.

Mike teve a sorte de presenciar um show do black flag em new jersey quando era adolescente em 1984. Desde então começou a se interessar por música e na sequência, o mundo do skate veio naturalmente. Desde 2002 integra a banda mike v. And the rats na qual é vocalista e letrista.

"we hit the streets born to run
Not looking for trouble just having fun
But around here its against the law to be young
Around here youre guilty by suspicion
We meet out in abandoned parking lots
Under the street lights just after dark
Armed with skateboards and guitars
Against gang fights, police states and holy wars
These are the days
We hang out in the garage and plug into amps
We skate our ramps and listen to the clash
We hold onto the night and try to make it last
The cars rush by going nowhere fast
Everyones down on main street
Got our skateboards under our feet
Were just talking trash in the heat
These are the days youd better breathe deep
These are the days"

Flogging Molly 

No ano de 1970 na cidade de san diego nasceu matt hensley. Executanto manobras com grau de técnica e inovação cabulosas hensley entrou na história do street skate na virada dos anos oitenta para os noventa. Segundo nosso amigo marcelo viegas: "hensley foi além da influência direta no skate, ele mudou a moda também. Ele criou um estilo que virou padrão. Todo skatista no começo dos noventa passava máquina 2 na cabeça, cortava o cano do tênis, usava salva-carteira e bermuda com bolsos laterais... E era exatamente assim que o hensley se vestia. Ele criou isso, e nós simplesmente copiamos... Não só nós reles mortais, como as marcas de skate que transformaram o "padrão hensley" em tendência da moda jovem mundial, a chamada street wear".

No pub molly malone's da cidade de los angeles surgiu a banda flogging molly em 1997. Fazem um folk irlandês misturado com punk rock. Uma espécie de the pogues estado unidense. Já possuem 3 álbuns bem interessantes mas o ponto forte são as apresentações ao vivo. Entre seus integrantes o septeto conta com uma garota tocando violino, com o irlandês dave king (o vocalista e guitarrista que nasceu em dublin) e tocando acordeon... Ele mesmo, matt hensley!!!!!!!

Mcrad - Iflation Dub

Chuck treece foi skatista profissional nos anos 80, marcou pontos no skate rock produzindo trilha sonora de videos como ban this ou public domain e como líder do grupo mcrad. Mcrad surgiu em 1982 na filadélfia. Neste mesmo ano participaram de uma coletêna obscura chamada "get off my back". Em 83 lançaram um 12 polegadas ("dominant force") com 8 faixas, e em 84 tiveram a honra de abrir o volume 2 das coletâneas da revista thrasher.

O único álbum do mcrad "absence of sanity" saiu em 1987. Mcshred e weekness (duas faixas deste álbum) ficaram imortalizadas pois serviram de trilha sonora em uma sequência matadora do vídeo public domain com os skatistas ray barbee, eric sanderson e steve saiz. Outra música deste disco também tem ligação com skate: a faixa 10 intitulada tg nada mais é do que uma homenagem ao melhor amigo de chuck treece nos seus tempos de skate. Tg são as iniciais de tom groholski, pró skater da vision também nos anos 80.

No começo dos 90 chuck treece resolveu encarar o skate apenas como diversão e se dedicou ao seu talento maior, a música. Além do mcrad o multi instrumentista treece tocou com urge overkill, underdog, the roots, billy joel, g. Love and the goats, disposable heroes of hiphopracy, black beans e supergrub. Mas seu maior orgulho (fora o mcrad e seu disco solo "dreamin'" de 1990) foi ter feito backing vocals no álbum quickness do bad brains além de se aventurar como vocalista e baixista em alguns shows do mesmo bad brains no ano de 1989.

Bones Brigade - Skate Or Die

Existiu uma equipe da marca powell peralta chamada bones brigade. Composta por skatistas do quilate de steve caballero, lance mountain, mike mcgill, tommy guerrero e tony hawk a facção marcou época no começo dos anos 80. Essa mesma turminha juntamente com outros profissionais estrelaram sob a direção do grande stacy peralta o primeiro video de skate da história! A pérola vhs de 35 minutos "the bones brigade video show" mostrava em video o que antes só se via nas revistas: caballero e mcgill no bowl de lakewood, tony hawk em del mar, rodney mullen certeiro no apaixonante freestyle, ruas, ladeiras, piscinas, rampas de fundo de quintal, skate parks, adrian demain, per welinder, kevin staab, todd hastings... Para 1984, uma loucura!!!!!!!

Anos atrás quando o revival dos anos 80 veio com tudo, alguns moleques resolveram reaquecer um estilo musical que marcou o final daquela década: o crossover (mistura caprichada de punk, hardcore e metal). Se auto intitulam "bandana trash" e adotam o visual calça ou bermuda jeans, tênis de skate, camisa xadrez, boné e bandana!!!!

Pelo lado skate rock da costa oeste estado unidense podemos citar como exemplo bandana trash o grupo what happens next? Com membros do all you can eat. Já no lado leste o melhor representante vem de boston e se chama bones brigade. Meio minor threat meio suicidal tendencies este quarteto ultra  veloz possue entre seus lançamentos um álbum obrigatório intitulado "i hate myself when i'm not skateboarding".

Riot 303 + Beyond possession

Quando se fala em skate rock canadense logo se pensa em snfu, mas duas bandas da cidade de calgary, ambas do vocalista ron hadley também merecem destaque: riot 303 e beyond possession.o riot 303 surgiu em 1981. No primeiro volume das compilações da thrasher apareceu com 4 (!!!!) Faixas: skate punx, murder the prime minister, depression session e nightmares of another kind. Faziam o skate rock clássico de 81/83 ala the faction/adolescents e possuem um 7 polegadas disputadíssimo chamado "crowd control".

Já o beyond possession é de 1984. No ano seguinte lançaram o compacto "tell tale heart" (título inspirado em uma obra de edgar allan paul) com 6 crossovers numa temática mórbida sobre vingança e morte. Uma das músicas (skater's life) se diferenciava das outras e foi escolhida para integrar o volume 3 das coletâneas da thrasher. Em 1986 gravaram seu único álbum "is this beyond possession lp" pela metal blade (gravadora clássica das bandas de crossover do meio dos anos 80).Anos atrás foi lançado pela melodiya records "repossessed", cd que engloba toda discografia do beyond possession.

Stalag 13 + ill repute ( nardcore )

Oxnard (cidade californiana próxima à santa bárbara) localizada à 100 quilômetros ao norte de los angeles era ponto de parada das bandas de hardcore que faziam turnês pela costa oeste. Bons fanzines ("60 miles north", "it's alive"), a gravadora mystic e boas bandas sedimentaram a cena local do meio dos anos 80, logo batizada de nardcore. Agression, ill repute, rkl, stalag 13 e dr. Know foram as bandas mais atuantes nos grandes anos do nardcore.

Além dessas podemos citar os obscuros conjuntos false confession, habeas corpus, rat pack e scared straight. Este último, embrião do ten foot pole/pulley gravou uma música chamada skate to live na coletânea nardcore lançada pela mystic em 1984. Outras bandas como nofx, lag wagon e strife também possuem raízes fincadas na cena de oxnard e santa bárbara.todas as bandas do nardcore tinham estreita relação com o skate rock. Dois registros clássicos desta cena são os discos "in control" do stalag 13 e "what happens next" do ill repute.

Minus One + Black Athletes

Com trilha sonora das bandas black athletes e minus one a sessão skate rock chega ao fim na sua parte de número 40. Procurando entender a relação dos skatistas com a música e vice-versa, foram executadas 49 canções de bandas canadenses, brasileiras, estado-unidenses, argentinas, australianas e alemãs.

Dissecamos o perfil de personagens importantes como steve caballero, steve alba, steve olson, duane peters, claus grabke, tony alva, chuck treece, ron emory, natas kaupas, mike vallely, césar lost, tommy guerrero, morizen foche. Você ouviu bandas clássicas como big boys, suicidal tendencies e agression. Assim como algumas desconhecidas porém muito boas como beyond possession, odd numbers e eight dayz.

A maioria das bandas resenhadas tiveram seu ápice quando o skate rock surgiu no início dos anos 80: t.s.o.l., j.f.a., d.i., joneses, gang green. Mas trouxemos também a nova geração como mike v. And the rats, monkeywrench ou bones brigade. Muita coisa ficou de fora. Normal.para encerrar a sessão skate rock duas bandas raras: minus one e black athletes.

Ambas participaram do primeiro volume das coletâneas skate rock da thrasher magazine. E pelo que se tem notícia nunca mais apareceram. Estão aqui hoje não por serem "super-ultra-mega raras" ou por serem as únicas bandas do primeiro volume que não tinham sido tocadas, mas sim por fazerem com qualidade o delicioso skate rock da primeira geração.

A Historia do Skate Rock




Aquela velha história, que o skate surgiu na California nos anos 60 quando surfistas em um dia de mar "flat" pregaram seus patins sobre tábuas, é verdadeira. Sendo mais preciso, isso tudo aconteceu em Santa Cruz, no ano de 1962, em frente à Surf Shop, loja de Jack O'Neill, criador das roupas de borracha.

Devagarinho, o sidewalk surfin', como era chamado na época, foi se alastrando por toda a California. Em 65 foram comercializados os primeiros "carrinhos" fabricados industrialmente, e assim ganhou seu nome definitivo: Skateboard. Virou febre local, ganhou revista especializada (a lendária: Skateboarder). Foram realizados os primeiros campeonatos, onde as modalidades mais interessantes eram o freestyle (moleques realizando acrobacias circenses sem estilo ou propósito), o slalom (cruzamento de cones), salto em altura e alguma velocidade em suaves declives. Até a Europa viu garotos "surfarem nas calçadas" da Torre Eiffel ou do Arco do Triunfo.

A trilha sonora que embalava estes jovens pioneiros, era o mesmo tipo de música que os surfistas gostavam, o rock'n'roll dos anos 60 e os Beach Boys. Até que no final dos anos 60, o skate desapareceu completamente. Nesta primeira onda do esporte, o skate foi encarado apenas como mais um gadget, ou seja, mais uma ferramenta de moda passageira infanto-juvenil, tipo bambolê ou iô-iô. Por isso foi uma febre e depois sumiu do mapa.

Dogtown and Z-Boyz


No começo dos anos 70, o skate estava em baixa no mundo todo, a febre já tinha passado e ninguém mais se interessava naquele limitado brinquedo com rodas de plástico. Até que em 1972, um surfista e engenheiro químico estado-unidense chamado Frank Gainsworthy inventou um novo material, as rodinhas de uretano. Em poucos meses, o uretano embalava skates e aí começava a primeira revolução do esporte. Além de silenciosas, eram realmente mágicos os benefícios que as Cadillac Wheels proporcionavam: velocidade, controle, estabilidade, durabilidade e aderência.

A partir daí, o que se viu foi uma sequência de acontecimentos que fez o skate evoluir sem parar. No quesito equipamento, vieram eixos especialmente projetados (Tracker Trucks), shapes laminados com lixas e rolamentos de precisão. As manobras íam surgindo a cada dia e naturalmente, e, sem nenhuma alavanca midiática ou publicitária, o skate ganhava uma popularidade impressionante. Skate parks pipocavam em todo mundo. A primeira surgiu em San Diego, CA. As mais extravagantes e perfeitas eram as americanas e européias.

A primeira pista de skate do Brasil surgia em 74, na cidade carioca de Nova Iguaçu. Em Curitiba, a primeira pista apareceu em 1976, na Praça do Redentor em frente à Sorveteria do Gaúcho. Mas o brasileiro que quisesse ter um bom skate nesta época, só um importado, pois o único fabricado por aqui era o Torlay, da Bandeirantes, um skate com rodinhas de plástico e eixos de patins, cópia fiel daqueles rústicos carrinhos de 1965.

Em 1976, uma forte estiagem assolou Los Angeles, e um racionamento de água obrigava o esvaziamento das piscinas por toda a cidade. Os skatistas encontraram nestas piscinas mais um ótimo lugar para andar e mais uma modalidade surgia: o Skate Vertical. Um pequeno garoto inventa "quase sem querer" uma manobra que tornaria quase tudo possível no mundo do skate: levitando seu carrinho nas piscinas (batendo com o pé de trás e guiando com o pé da frente), Allan Gelfand nem sonhava que seu pequeno ollie pop em transições verticais, revolucionaria as manobras e a forma de andar de skate. Alguns anos mais tarde o também pequeno Rodney Mullen, levitava seu skate em superfícies planas, ampliando ainda mais o leque de possibilidades.


Protagonistas e responsáveis por toda evolução e rápida transformação do skate, os Z-Boys marcaram época entre 75 e 79. Lendária turma de skatistas que surgiu em Dogtown, nome de uma região de poucas quadras situada entre Venice e Santa Monica. Venice, tinha sido idealizada como uma espécie de Coney Island do Oeste americano; um bairro temático (imitava Veneza) com um enorme parque de diversões (Pacific Ocean Park- P.O.P.). Abandonada e desvalorizada no final dos anos 60, a região agora chamada de Dogtown, foi adotada por hippies, surfistas rebeldes e músicos como Jim Morrison, transformando a região num mosaico de etnias, idéias e atitudes. Uma terra de ninguém, onde hippies, surfistas, piromaníacos e junkies poderiam se exceder em simbiótica desarmonia, entre os escombros do P.O.P Pier, sanatórios, liquor stores e centros de reabilitação.

Neste cenário, uma garotada working class, filhos de pais separados, surfava de manhã na praia de Venice. À tarde, se encontravam para andar de skate em frente a surf shop Zephir em Dogtown. Encantados com a evolução da garotada, os donos da Zephir (Jeff Ho, Skip Engblom e Craig Stecyk) resolveram patrocinar e formar uma equipe de skate para competir no primeiro grande campeonato americano, o Del Mar Nationals. Assim nasceu a equipe Z-Boys Skate Team. Até então, excetuando aquela turminha de Dogtown, a maioria dos skatistas andavam como nos anos 60.Neste campeonato de Del Mar, o Z-Boy Jay Adams mostrou um novo estilo e manobras inéditas. Os juízes espantados, não sabiam como julgar, os outros competidores ficaram putos e a platéia extasiada. Um artigo e um ensaio fotográfico feito por Stecyk para a revista Skateboarder, transformou os Z-Boys em heróis do dia para a noite.

"Aquelas fotos mostravam muito mais do que um cara andando de skate. Elas mostravam um estilo de vida, uma atitude, um código." (Henry Rollins)

Os Z-Boys (onze homens e uma garota, Peggy Oki) eram uma banda de punk rock sem guitarras. E antes do punk. Como bons rebeldes, não estavam em busca de fama ou fortuna. Isso veio naturalmente. O que eles queriam mesmo era andar de skate, e se fosse necessário invadiriam casas de forma ilícita, para usufruirem de suas piscinas vazias. Hoje em dia, com a explosão da mídia, seria impossível que eles durassem como uma força underground íntegra por tanto tempo.

Os Z-Boys e todos os outros skatistas daquela área quebraram barreiras no esporte e na sociedade. Em apresentações por todo o país, levaram o estilo de vida e a essência do skate ao limite máximo. Tornaram-se famosos e afortunados com 20 anos de idade. Ao mesmo tempo, invadiam a sua casa, andavam de skate na sua piscina, realizando manobras cada vez mais radicais, colocavam uma fita do Ted Nugent, Hendrix ou Led Zeppelin no seu stereo, fumavam um baseado e caíam fora. Trouxeram ao skate uma imagem de "fora-da-lei", rebelde e outsider. Mexicanos, franceses, asiáticos, negros, brancos e judeus inventando "coisas" como frontside airs e handplants. Dalí sairam nomes como Jay Adams, Stacy Peralta, Jim Muir, Tony Alva, Allen Sarlo, Bob Biniak, Wentzle Ruml, Shogo Kubo, Peggy Oki, Nathan Pratt, Chris Cahill e Paul Constantineau.

Gino, amigo desses caras, era um menino rico que estava morrendo por causa de um câncer. O pai de Gino, resolveu esvaziar a sua piscina, e convocou todos os Z-Boys para lá andarem de skate sem a preocupação de serem presos pela polícia. Chamaram a pista de Dogbowl, pois vários cachorros vagavam em volta da piscina.

"As sessions no Dogbowl entre 77 e 80 foram o auge para todos nós. Foram os anos de ouro" (Tony Alva).

Foi no Dogbowl que Alva realizou o primeiro frontside air da história. Os aéreos de Tony Alva foram o ponto de partida para uma nova era no skate. Para se ter uma idéia da importância desses caras no skate, vamos falar um pouquinho mais sobre os mais notáveis.

Tony Alva: o original, o Chuck Berry do skate. O inventor do skate vertical, o primeiro cara a realizar um aéreo, o primeiro a estruturar uma vida estritamente no skate. Hardcore, radical e estiloso. Sinônimo de invasão domiciliar para deslizar em piscinas. Proprietário de sua própria e bem sucedida marca, Alva Skateboard Company. Começou no meio dos anos 60 e continua viajando pelo mundo em demostrações e eventos.

Jay Adams: a alma, o espírito, o Little Richard do skate. Visceral e criativo, criava manobras a cada dia. Sua contribuição ao skate não tem paralelos. Começou com 6 anos de idade, junto com o surf. Seu pai, Kent Sherwood, surfista de longa data, alugava pranchas em Venice. Reconhecido como o mais talentoso Z-Boy, freqüentemente premiado e dono de uma grande legião de fãs em todo mundo. Sucumbiu às tentações de um jovem de sucesso e atualmente está preso no Hawaii, atrás das grades por uma séries de episódios com drogas.

Stacy Peralta: um dos pais do skate moderno. Foi o primeiro Z-Boy que trabalhou a sua imagem e seus lucros. Anos depois fundava junto com George Powell sua própria marca, a legendária Powell Peralta. A marca mais influente da história do skate, a marca que descobriu Tony Hawk e o patrocinou quando este tinha apenas 11 anos. Chefe e fundador da equipe Bones Brigade. Sempre ligado ao cinema, trabalhou com Steven Spielberg e revolucionou os filmes de skate com o marcante, The Bones Brigade Video Show, em 1984. Em 91 abandonou a Powell Peralta para trabalhar apenas com produção e cinema.

Jim Muir: o coração e a raiz do skate em Dogtown. Enquanto os Z-Boys competiam, Muir ficava atrás da cena, confeccionando shapes para os seus colegas. Feitos a mão, as tábuas de Muir eram as melhores, mais leves e resistentes. Em 76, começou a vender suas tábuas sob o nome de Dogtown Skateboarding, colocando a logomarca Dogtown no mercado. Desde então, dirige a empresa e pratica surf e snowboard freqüentemente. Ainda mora em Venice com seu filho de 10 anos. Seu irmão mais novo, Mike Muir, levou o nome Dogtown para o mundo da música, com a famosa banda Suicidal Tendencies.

Shogo Kubo: imigrante japonês, chegou em Venice aos 12 anos. Começou motivado por Jay Adams, que andava de skate no estacionamento da escola de judô que ambos freqüentavam. Atualmente mora no Havaii, onde pratica surf longboard. Voltou ao skate a poucos anos atrás, inclusive assinando um model para a Bull Dog Skates.

Allen Sarlo: terceiro lugar em slalom no Del Mar Skate Nationals. Aos 16 anos, como membro do Jeff Ho Surf Team, conseguiu a façanha de vencer o lendário campeonato de surf Malibu 4-A. Atualmente, um surfista big rider de primeira, competindo no Master Quicksilver Pro-Tour. Surfa todo dia; anda de skate na rampa que construiu no quintal de casa, quando o mar está pequeno.

Craig Stecyk: mentor da equipe Z-Boys. Fundador da Jeff Ho and Zephir Productions Surf Shop. Pintor, fotógrafo e jornalista. Grafitando e pintando shapes, seu traçado marcou a estética surf/skate. Desenhou a famosa logomarca das
rodas Rat Bones.

Não posso deixar de recomendar o filme: Dogtown & Z-Boys. Premiado como o melhor documentário do Festival de Sundance de 2001, o filme foi dirigido por Stacy Peralta. Retrospectiva completa sobre a época por meio de imagens originais feitas em Super 8 e entrevistas atuais. Narrado pelo ator Sean Penn, o documentário de uma hora e meia ainda conta com depoimentos de músicos como o black flag Henry Rollins, Ian MacKaye (Fugazi) e Jeff Ament do Pearl Jam. Sucesso nos cinemas americanos, aqui no Brasil ficou em cartaz apenas na 26ª Mostra BR de Cinema de SP, em outubro. Torcemos para que em breve apareça pelo menos nas video locadoras.

Outro biscoito fino sobre Dogtown e os Z-Boys, vem de um dos melhores fotógrafos de todos os tempos: Glen E. Friedman. Glen começou a fotografar a cena de Dogtown em 1974. Aos 14 anos, se tornou colaborador da Skateboarder Magazine. Também documentou o início do hardcore americano no final dos anos 70 e as raízes do Rap no meio dos 80. Trabalhou com muitas bandas importantes como Dead Kennedys, Suicidal Tendencies, Misfits, Fugazi, Beastie Boys e Run DMC. Glen compilou seus 25 anos de carreira no skate e na música, em dois livros: Fuck You Heroes (94) e Fuck You Too (96). Além de colaborar com o documentário, Glen lançou o livro: "Dogtown - The Legend Of The Z-BOYS", seu trabalho mais recente.

Like A Method Air Into The Mosh Pit

Os anos 80 começam com Eddie Elguera inventando manobras complicadíssimas e linhas consecutivas no vertical, e com Mark Mothersbaugh, vocalista do DEVO, gravando o clip da música Freedom Of Choice dentro de uma pista de skate. O esporte estava ficando grande, muitas marcas especializadas, muitos campeonatos, muita grana rolando. O skate não estava mais tão vinculado ao surf como na época dos Z-Boys, já tinha vida própria, já tinha um estilo, uma atitude, um tipo de roupa e um tipo de música preferida.

Skatistas gostavam de punk/hardcore e punk rockers andavam de sk8 4 fun; esta simbiose estreitava os laços do esporte com bandas como Agent Orange, Adolescents, Bad Brains, Fear, Big Boys, Social Distortion, Misfits, Beastie Boys, Black Flag ou Minor Threat. Os nomes mais populares do skate desta época eram os atletas patrocinados pela Powell Peralta e a equipe Bones Brigade: Tony Hawk, Steve Caballero, Lance Mountain e Mike Mcgill no vertical, Tommy Guerrero no street style e Rodney Mullen e o suéco Per Welinder no freestyle. Outros atletas também merecem destaque como Jeff Phillips, Chris Miller, Tony Magnusson e Christian Hosoi. Observe que a maioria dos notáveis desta época, eram skatistas da modalidade vertical.

A relação do skate com o punk rock se estreitou ao longo da década. Em 1981, Tommy Guerrero e seu irmão Tony formam uma banda, Free Beer, em San Jose. Nesta mesma cidade em 82, Steve Caballero monta a sua, The Faction. Em 83, o irmão mais novo do lendário Z-Boy Jim "Dogtown" Muir, Mike Muir, lança o primeiro disco de sua banda,Suicidal Tendencies, o video da música Institutionalized mostrava pela primeira vez o skate na MTV. Também em 83, uma banda de Oxnard, chamada Agression, lançava o maravilhoso álbum Don't Be Mistaken. Na capa uma foto de Glen E. Friedman, e um cara andando de skate, na letra da música Intense Energy, um relato de uma pool skate session. Tony Alva tira a poeira de seu encostado contra-baixo, recruta Mike Ball (ex-guitarrista da primeira formação do Suicidal Tendencies) e monta a banda Skoundrelz.

No Texas, um bando de moleques skatistas formam o JFA, a primeira banda que se auto-proclamou skate rock. Mas o gênero teve seu batismo oficial apenas quando o fotógrafo da revista Thrasher, Morizen Foche (MoFo, vocalista do Drunk Injuns), organizou a primeira compilação da Thrasher Magazine em 83. A Thrasher, fundada em janeiro de 81, já tinha consolidado a imagem rebelde, contestadora e "skate and destroy". Lançando uma fita cassete por ano, a revista divulgava para seus leitores as bandas que de uma forma ou de outra tinham a ver com o skate. Thrasher Skate Rock Vol 1 - é um clássico. Abria com Los Olvidados, Big Boys, Riot 303 e Minus One. Faction, Skoundrelz, Drunk Injuns, JFA e Black Athletes completavam a fita. Uma ou duas músicas de cada banda, sendo a maioria delas da California, com destaque para as bandas de San Jose.

O Volume 2 seguia a mesma linha, abrindo com McRad e TSOL. Free Beer aparecia entre outras bandas menos conhecidas. Faction, JFA, Los "O", Big Boys e Drunk Injuns davam as caras novamente. A terceira fita, trazia bandas mais crossover (em alta, na época) como Boneless Ones, Christ On Parade, Septic Death, Corrosion Of Conformity, Accused e Gang Green.

A partir da quarta compilação, em 1986, a seleção musical apareceu de forma mais eclética. Apareceram nomes como Skate Master Tate e Tupelo Chain Sex. Steve Caballero aparecia, desta vez em projeto solo. Este ecletismo do skate rock, nada mais foi do que um retrato do caminho que o skate estava tomando. Com a incorporação de manobras do freestyle, o street style crescia, as ruas foram tomadas por streeteiros, e nas ruas começava a se popularizar o hip hop, o funk e outros estilos musicais. Assim mesmo, em todas as compilações posteriores, o punk/hardcore era o carro chefe.

O quinto volume abria com SNFU. Stupids, Dehumanizers e novamente o JFA também marcavam presença. A turma de Venice trazia Excel, Beowulf e No Mercy. Steve Alba mostrava sua banda, Screamin' Lord & His Heavy Friends. A cada ano, uma nova fitinha e bandas como Bad Religion, Sheer Terror, Samiam, D.I., Funk Face, Uniforme Choice, Bad Mutha Gooze, Insted, Wrecking Crew, Curious George, Verbal Abuse, Less Is Moore, Odd Numbers, etc etc etc.

Em 1993, o 11º e último volume, trazia Sick Of It All, C.O.C., All You Can Eat, NOFX, Youth Gone Mad, BNU, Lag Wagon, Accused e Fudge Tunnel. A fita cassete já não era tão popular, o formato compact disc chegava com tudo; CDs de hip hop embalavam rotinas de campeonatos de street.

Nos anos 90, o skate ficou mais técnico. O street continuou em alta e o skate vertical se reciclou. Se antigamente, quase todas as bandas do hardcore americano faziam parte da comunidade do skate, agora não existia mais o gênero skate rock de forma tão emblemática. A turma do street, mais eclética, era embalada pelo rap, reggae, punk e até música gospel.

A turma do vertical ainda prefiria o hardcore, mesmo em sua forma mais inofensiva, o melódico. A Thrasher ainda era uma referência, mas a revista Big Brother (do polêmico Larry Flint) foi a que mais inovou. Assim como o brasileiro Bob Burnquist, o melhor skatista da atualidade, o rei do switchstance (não existe mais frente ou costas, as manobras são realizadas com a base trocada também) recusando patrocinio milionário da Nike, pois a marca só chegou quando o esporte já estava grande. Hoje o skate é o quinto esporte dos E.U.A. São novos tempos, há pouco espaço para aquela ingenuidade dos Z-Boys ou para a "Death or Glory" da turma dos anos 80.

Tony Hawk continua apavorando em cima do skate ou fora dele. Tommy Guerrero, longe dos tempos de Free Beer, agora é músico de jazz/pós rock, com relativo sucesso no Japão. Seu álbum Little Bit Of Something foi lançado no Brasil, estou ouvindo neste momento, recomendo. Steve Caballero, sempre ativo no skate e no rock, continua tocando guitarra no The Faction. Jeff Phillips se suicidou (a banda argentina Fun People fez uma música em sua homenagem). Mark Gator Rogowski, virou fanático religioso e depois matou a melhor amiga da namorada em 92, só sái da prisão em 2010. Christian Hosoi, também está preso (de setembro de 2001 até começo de 2007) por tráfico de drogas.

Go For It

"Ah, a tristeza de saber, no fim da leitura de certos livros, que nunca mais os leremos pela primeira vez, que não se repetirá jamais a sensação da primeira leitura".

Transporto esta frase para o skate e para a música, e penso que nunca mais sentirei aquele "clic inside" igual aquele que senti quando ouví Ramones It's Alive ou Buzzcocks Singles Going Steady pela primeira vez. Nunca mais ficarei bêbado da mais pura euforia, a euforia infantil, de deslizar em um skate pela primeira vez, dentro da loja Tom Brasil (Nilo Cairo, 300) aos 13 anos de idade.Algumas sessions no Jardim Ambiental eram embaladas pelo som stereo que o Maguila (dono da Maha) levava. A primeira vez que ouvi Suicidal Tendencies, Agent Orange foi lá. Eu, o Guinalda íamos na Maha e tinha um poster do Suicidal Join The Army estourando na parede.

Mas o ponto alto de tudo isso, era o campeonato que a Maha realizava uma vez por ano no Ambiental. Toy Dolls, Dead Kennedys, TSOL, Misfits, PIL, Oingo Boingo, go for itizando os "semi-prós" Maguila e seus judo airs com cross bones azuis, Pepeu e seus smith grinds de front com bullets 66 amarelas, Franco e seus lien airs, Catarina e seus inverts, Márcio Cabalero e seus boardslides.

Piolho e Misael aprendiam suas primeiras manobras. Marcelo Kosake já se destacava entre os amadores. Tudo com muito estilo na pista, as belas amigas da sua irmã mais velha nas arquibancadas e uns piás como eu, o Guinalda, o Rodrigo "No Milk Today" Minduin, o Pança, o Joãozinho, o Osiris e o Josu, se sentindo no paraíso.

O skate no Brasil se popularizou no meio dos anos 80. Toda cultura do skate nacional era importada dos E.U.A. As marcas brasileiras eram as gringas chupadas, o tênis Mad Rats era cópia descarada do Vans... Mesmo assim foi uma fase muito legal. O skate brasileiro superou o plano Collor, superou o prefeito Jânio Quadros proibindo o skate nas ruas de S.P. em 89, superou o fim das revistas Yeah! e Overall, sobreviveu, cresceu e hoje é campeão do Mundo.

A Overall Skate Magazine, da editora TRIP, sempre produzia algo interessante. A minha capa predileta é a da edição 17 (Set 89) com a Silvia Rossi fotografada no quarto do Mureta. A Overall era comandada pelo editor Paulo Lima, pelo César Girão (atualmente da Revista Tribo), Cesinha Chaves, Formiga, Daniel Bourqui (hoje fotógrafo renomado nos E.U.A.), entre outros. Alguns destes, lançaram recentemente o livro A Onda Dura - 3 Décadas de Skate no Brasil. Confira.

Hoje a piazada compra a excelente revista do Alê Vianna, a 100% Skatemag e na seção de som, lê coisas escritas por quem realmente conhece, como o skatista e músico César Lost. Skate Rock como gênero musical no Brasil, praticamente não existiu. Para não passar em branco podemos falar do Coquetel Molotov, primeira banda punk do R.J. com o freestyler Lúcio Flávio. Em S.P. apareceu o Necrópole (tocando Intense Energy do Agression, no programa Boca Livre do Kid Vinil - Tv Cultura - às segundas, 20h - lá pelos idos de 1989) e o Grinders.

Mas na verdade a garotada ouvia o que estava sendo lançado na época ou o que o Bolota, o Arthur Verissimo, a Cecília Mãe e o Guto Jimenez escreviam na Yeah! ou na Overall. Então tinha de tudo: The Cure, TSOL, Circle Jerks, Adolescents, Toy Dolls, Metallica, Public Enemy, The Smiths, Sepultura, Ratos de Porão, The Cult, umas coisas góticas, uns reggaes.

No começo dos anos 80, a reputação dos skatistas estado-unidenses como arruaceiros e encrenqueiros estava crescendo; assim como um outro fenômeno cultural: o punk rock/hardcore. O novo som se engrenava perfeitamente com a atitude do skate. Em ambos, as regras eram claras: "There are no rules". Uma simbiose perfeita, um não se separava do outro.

A cidade de San Jose, ao norte da Califórnia, sempre teve uma extensa e rica história no skate. De lá surgiram profissionais como Jeff Kendall, Mike Prosenko, John Fabriquer, Corey O'Brien (que começou a Sonic Skateboards com seu irmão Gavin) e, é claro, o lendário e ainda atuante Steve Caballero.E foi neste cenário que surgiu o melhor exemplo desta conexão entre o punk e o skate, conhecido como skate rock: The Faction, tendo na formação os já supra citados Steve (contra-baixo) e Gavin (vocal). A banda foi formada na pista do quintal da casa de Steve Caballero, no Halloween de 1982. O primeiro show foi no dia 3 de dezembro, abrindo para o Social Distortion. Nos anos seguintes, lançam dois compactos, um EP, participam das coletâneas da Thrasher e fazem a primeira tour pelos EUA.

Em 85, recrutam (o ex-baixista do Los Olvidados e Drunk Injuns) Ray Stevens II, com Steve Caballero assumindo a segunda guitarra e lançam seu trabalho mais clássico e inspirado, o EP "Dark Room". Depois outro EP, "Epitaph". No Halloween de 85, a banda acaba, num show em San Jose, abrindo para o Hüsker Dü. Em 89, se reúnem para fazer apenas dois shows, contando com o skatista profissional Jeff Kendall no lugar do guitarrista Adam Segal.

No meio de 2001, inspirados pela volta dos Los Olvidados, o The Faction também resolve se reunir novamente. Desde então fazem shows esporádicos na região de San Jose ou em eventos e campeonatos. A formação atual é: Steve Caballero (rhythm guitar), Ray Stevens II (bass), Gavin O'Brien (vocals), Russ Wright (guitar) e Keith Rendon (drums). Já gravaram uma demo com 4 novas músicas e neste ano um novo disco pode surgir, seguindo a linha do EP "Dark Room".

Sugiro a compilação "The Faction Collection 1982-1985" e outra coletânea intitulada "Bandology - vol 1", que dá uma boa circulada por toda a carreira musical de Steve Caballero, com fotos clássicas e palavras sobre a história do skate rock. Inspirado por Stacy Peralta e Eddie Elguera, Steve teve seu primeiro contato com o skate em 1976, aos 11 anos. Famoso pelo seu pescoço torto (devido a uma escoliose), aos 16 anos já se destacava como um dos melhores skatistas de San Jose. Venceu ou foi finalista da maioria dos campeonatos mundiais do início dos anos 80. De 82 até 85 tocou na banda The Faction. Depois integrou as bandas Odd Man Out (87-8, Shovelhead (91-94) e Soda (95-96). Atualmente se diverte com o retorno do Faction, se dedica seriamente a evoluir no street style e é um dos skatistas da velha escola, mais requisitados em eventos como o Old School Skate Jam.

Assim como os old schoolers do skate foram valorizados novamente, o mesmo aconteceu com o skate rock, que nos últimos anos foi resgatado da eterna obscuridade. A gravadora Alternative Tentacles lançou no meio de 2002, três álbuns - com bandas importantíssimas, mas que nunca tiveram registrados seus trabalhos da forma merecida - que sintetizam este resgate histórico do skate rock:

Free Beer - "The Only Beer That Matters" - coletânea com músicas da primeira banda dos irmãos Tommy e Tony Guerrero;

Los Olvidados - "Listen To This" - banda de San Jose, altamente influenciada pela primeira onda do punk (Dead Boys, Radio Birdman, Saints). Na ativa entre 80 e 83, podem ser considerados o TSOL ou Agent Orange ou Adolescents do norte da Califórnia;

Drunk Injuns - "From Where The Sun Now Stands I Will Fight No More, Forever" - o terceiro lançamento da Skate-Punk series da Alternative Tentacles. A mais misteriosa e instigante banda da turma. Circa 83-84. O supra sumo do lado gothic do skate rock. Confira abaixo o nome de algumas bandas clássicas do skate rock que já foram citadas ou não, ou bandas que de uma forma ou de outra têm alguma relação com o skate:

Agression - a minha banda favorita do skate rock, o álbum "Don't Be Mistaken" está entre os meus Top 20.

U.S. Bombs - banda do old school Duane Peters. Skatista clássico, que inclusive participou das gravações do vídeo da música Freedom Of Choice do DEVO. Após anos de abuso de drogas, Peters está mais limpo e ativo do que nunca, sua outra banda, The Hunns também merece ser citada.

2 Cents Worth - com Adam Segal, ex-The Faction.

The Clay Wheels - outra banda do Ray Stevens II.

ILL Repute, Agent Orange, Big Boys, Bonelles Ones, JFA, Die Kreuzen, Odd Numbers (mod + san jose skate rock style !!! - muito bom), Stalag 13, TSOL (Flowers By The Door, tema de abertura do programa Grito da Rua), Suicidal Tendencies, DEVO, Circle Jerks, Drunk Injuns, Spermbirds, Minor Threat, D.I., Skoundrelz, Skatemaster Tate And The Concrete Crew (skate funk puro), Monkeywrench (com membros do Mudhoney), Free Beer, Los Olvidados, SNFU, Beastie Boys, Millencolin (com model de tênis pela Vans), Adolescents, Fu Manchu (stoner rock com capa de álbum com photo by Glen Friedman), Life Sentence (banda muito phoda, com apenas um registro fonográfico), McRad, Minus One, Tommy Guerrero, Stupids, Token Entry, Screaming Lord Salba, R.K.L., etc etc etc...

A HISTORIA DO HARDCORE, 1977-81

1977. Era uma vez o punk rock. Na inglaterra velhinhas arrancavam os cabelos com o vocabulário crasso dos Sex Pistols e seu desrespeito pelas instituições da monarquia Britânica. Do outro lado, a juventude inconformista das ruas aclamava o punk como o movimento que finalmente dava voz aos desajustados. Um movimento que permitia que a molecada tomasse o rock de volta para ela, uma música que falava de temas reais, agressivos e relevantes. Enfim, era algo novo, excitante e deles. Mas nem tudo são flores. A indústria cultural viu no punk uma nova oportunidade de ganhar dinheiro, e contratou todos os principais nomes do movimento. Da mesma forma, bandas oportunistas pularam no vagão do punk rock sem ter de fato a essência da coisa no coração. Não preciso nem dizer que em questão de meses o punk estava virtualmente morto, assimilado, diluído dentro do incestuoso caldeirão da mídia e das gravadoras. Mesmo bandas honestas, até mesmo algumas independentes, abandonavam o esporro punk em nome de sonoridades mais "criativas", letras mais "introspectivas", idéias mais "artísticas".

O fato é que na inglaterra de 1977, o punk foi a "sensação do ano", e todos sabem que "sensações do ano" não duram mais do que um ano. Foi fogo de palha, e em 1978 a coisa já tinha meio que ido para o brejo. Eu proponho uma brincadeira divertida. Pegue as principais bandas punks da primeira geração que lançaram pelo menos 2 ou 3 discos. Observe como o segundo ou terceiro disco sempre é mais levinho, tem teclados, letras mais "na manha" e arte mais elaborada. Não é por acaso. Mas não foi para o brejo para todo mundo. Se os grandes nomes abandonaram o barco, a mídia e as gravadoras se desinteressaram, a molecada, que deveria ter sido a dona do punk desde o começo se manteve fiel.

O punk foi abandonado pelo sistema (que para cooptá-lo precisou transformá-lo em new wave), e adotado pelos fanáticos, pelos casca-grossa. Fanático e casca grossa justamente são traduções livres para o termo inglês "hard-core". Logo, tanto na inglaterra quanto nos EUA, novas versões mais extremas do punk começaram a aparecer, contrastando com a new wave, o pós punk e todos os subprodutos diluídos do fenômeno original. Na inglaterra, o Oi! , o anarco-punk e o chamado "punk's not dead" (muitas vezes considerado o hardcore inglês), foram as mais célebres facções dessa agressiva retomada aos fundamentos do punk rock.

Já nos EUA, aparecia (especialmente no sul da California e em Washington D.C.) uma vertente violenta, seca e desagradável, apelidada de hardcore-punk. A música era ultra rápida, cada vez mais despida de "rockismos" (solinhos, ranço hard-rock, etc...), agressiva, distorcida. Uma nova batida de bateria, o 2/2 (apelidado de paco-paco) mega-veloz, enterrava de vez o resquício blues 4/4 do rock and roll. Enfim, eram bandas que pegavam o punk, tiravam dele apenas o que achavam essencial, exageravam essa "essência" e jogavam o resto no lixo. Da mesma forma, o público também era "mais rápido", "mais agressivo", e mais jovem. Se em Nova York a cena punk do final dos anos 70 girava em torno de uma elite de junkies sado-masoquistas de 25, 30 anos leitores de Rimbaud e amigos do Andy Warhol, essa nova cena do sul da California era formada por surfistas/skatistas/gangueiros adolescentes com cabeças raspadas, músculos exercitados pelos esportes radicais, brigas e vandalismo, e um ódio mútuo pela polícia mais violenta dos EUA, o L.A.P.D. (departamento de polícia de Los Angeles). Essa galera vinha principalmente de cidades praianas próximas a L.A., e desse pessoal surgem bandas célebres como Black Flag, Circle Jerks, Adolescents, Redd Kross, China White, Bad Religion, entre outros.

Mas antes mesmo de haver o termo "hardcore", ou uma diferenciação entre os públicos "intelectual maduro" e "adolescente tosco" era fácil de perceber que a California era o berço de algo novo, algo mais agressivo, mais direto e mais intenso (vide a discografia). Muitas das primeiras bandas punks de Los Angeles, como Dils, Germs e o próprio Black Flag eram muito mais podres do que qualquer coisa da época em qualquer lugar do mundo. Certo, a política dos Dils era proveniente do esquerdismo do Clash, mas se o Clash era político "às vezes", os Dils eram Marxistas linha-dura. Da mesma forma, o niilismo dos Germs vinha diretamente do Iggy Pop e do Sid Vicious, mas também era exagerado e embebido numa música anos-luz mais agressiva. Já o Black Flag continha praticamente todos os ingredientes da "receita" hardcore.

Até que por volta de 1980, já havia em L.A. uma clara diferenciação entre a galera punk "da antiga" (que havia começado a cena punk local longínquos 3 anos antes), mais velhos, intelectualizados e cada vez mais interessada em propostas estéticas criativas, e o contingente de moleques brutais de cabeça raspada. Ia embora o pogo estilo inglês (pulos no mesmo lugar), e em seu lugar entrava a chamada Slam Dancing (porradaria, stage dives, rodas, etc...). A violência estética finalmente se transformava em violência física, ainda que de maneira "camarada", entre parceiros. Da mesma forma, o ódio à autoridade que existia nas letras punks se transformava em algo real. Shows do Black Flag eram frequentemente perturbados pela tropa de choque, e não era raro haver helicópteros da polícia sobrevoando os locais (cordões de isolamento e gás lacrimongêneo então eram lugar comum). Ainda na Califórnia, mais ao norte, em São Francisco, uma banda com um nome extremamente chamativo começava a se destacar. Eram os Dead Kennedys, com um punk agressivo como o de L.A., extremamente irônico e politizado, e com idéias musicais das mais variadas (influência de Surf Music, Jazz, Rockabilly, trilhas sonoras de faroeste, etc...). Os shows brutais, o som rápido e violento e a política radical, certamente faziam deles dignos representantes do tal "hardcore-punk".

No outro extremo do país, em Washington D.C., uma banda chamada Bad Brains estava, desde 78/79 fazendo um punk rock totalmente novo, mais rápido e sem regras. Ao contrário da maioria dos punks americanos, os Bad Brains eram negros e até ouvirem discos dos Sex Pistols, Ramones e Damned, tocavam Jazz-Funk. De qualquer maneira, havia uma força sobrenatural unindo-os com seus comparsas californianos, e já em 1979 o som da banda era rápido o suficiente para ser chamado de hardcore até hoje. Em volta dos Bad Brains, surge na cidade uma turma de punks adolescentes que tinham muito a ver com a galera de L.A. de que falávamos acima, com a diferença de serem mais pacíficos e não beberem nem se drogarem. Dessa galera surgem várias bandas, em especial os Teen Idles e o S.O.A.. Pois em 1980, os Teen Idles vão tocar na Califórnia, assistem os Circle Jerks e os Dead Kennedys, vêem seus primeiros stage dives, fazem amigos e voltam para Washington sentindo-se totalmente identificados com o que rolava em L.A. Junto com a banda foi o amigo nº1 deles, o vocalista do S.O.A., Henry Garfield. Henry, cerca de um ano depois entraria no Black Flag, mudaria seu nome para Henry Rollins e se transformaria em um ícone do hardcore (e, anos depois, rockstar e ator de filmes ruins). Já os Teen Idles acabam no final de 80, se transmutando numa nova banda, o Minor Threat, que rapidamente iria se tornar tão importante quanto as bandas californianas que os inspiraram.

A turma de Washington levou para casa elementos estéticos e musicais da cena californiana, tais como a cabeça raspada e o "slam-dancing", e conforme foram ficando conhecidos, o vírus do hardcore se espalhou pela costa-leste, contaminando em especial lugares como Boston e Nova York. Um episódio interessante foi o show do Black Flag em NY, 1981. Toda turma de Washington foi para lá prestigiar os figurões californianos. No dia seguinte, o célebre crítico Lester Bangs comentava no jornal a presença de uma horda de carecas feios e rudes com um jeito de dançar extremamente agressivo.

De qualquer maneira, em 1980 saem os primeiros LPs dos Dead Kennedys e dos Circle Jerks e em 81 sai Damaged, o clássico do Black Flag e o primeiro EP do Minor Threat. Numa América onde havia apenas focos de infecção (na California e em Washington), surge uma verdadeira inflamação generalizada de bandas rápidas, agressivas, diretas e mal-educadas. O hardcore toma conta da América, e o país têm sua primeira verdadeira explosão punk (já que em 77 os americanos preferiram John Travolta e a disco). Em Chicago (Necros, Effigies), Minneapolis (Husker Du), Texas (D.R.I., Dicks, Big Boys), Boston (SSD, Jerry's Kids, F.U.s), NY (The Mob, Urban Waste, Beastie Boys), Detroit (Negative Approach), Reno (7 Seconds), Seattle (Fartz), Portland (Poison Idea)... de todos os rincões da América emergiam bandas e mais bandas desta que era até então a música mais agressiva, contundente e perturbadora jamais feita pela raça humana, e com essas bandas surge todo um circuito de gravadoras independentes, fanzines, e organizadores de shows que persiste até hoje, livre da nefasta influência corporativa.