terça-feira, 12 de agosto de 2008

A Historia do Skate Rock




Aquela velha história, que o skate surgiu na California nos anos 60 quando surfistas em um dia de mar "flat" pregaram seus patins sobre tábuas, é verdadeira. Sendo mais preciso, isso tudo aconteceu em Santa Cruz, no ano de 1962, em frente à Surf Shop, loja de Jack O'Neill, criador das roupas de borracha.

Devagarinho, o sidewalk surfin', como era chamado na época, foi se alastrando por toda a California. Em 65 foram comercializados os primeiros "carrinhos" fabricados industrialmente, e assim ganhou seu nome definitivo: Skateboard. Virou febre local, ganhou revista especializada (a lendária: Skateboarder). Foram realizados os primeiros campeonatos, onde as modalidades mais interessantes eram o freestyle (moleques realizando acrobacias circenses sem estilo ou propósito), o slalom (cruzamento de cones), salto em altura e alguma velocidade em suaves declives. Até a Europa viu garotos "surfarem nas calçadas" da Torre Eiffel ou do Arco do Triunfo.

A trilha sonora que embalava estes jovens pioneiros, era o mesmo tipo de música que os surfistas gostavam, o rock'n'roll dos anos 60 e os Beach Boys. Até que no final dos anos 60, o skate desapareceu completamente. Nesta primeira onda do esporte, o skate foi encarado apenas como mais um gadget, ou seja, mais uma ferramenta de moda passageira infanto-juvenil, tipo bambolê ou iô-iô. Por isso foi uma febre e depois sumiu do mapa.

Dogtown and Z-Boyz


No começo dos anos 70, o skate estava em baixa no mundo todo, a febre já tinha passado e ninguém mais se interessava naquele limitado brinquedo com rodas de plástico. Até que em 1972, um surfista e engenheiro químico estado-unidense chamado Frank Gainsworthy inventou um novo material, as rodinhas de uretano. Em poucos meses, o uretano embalava skates e aí começava a primeira revolução do esporte. Além de silenciosas, eram realmente mágicos os benefícios que as Cadillac Wheels proporcionavam: velocidade, controle, estabilidade, durabilidade e aderência.

A partir daí, o que se viu foi uma sequência de acontecimentos que fez o skate evoluir sem parar. No quesito equipamento, vieram eixos especialmente projetados (Tracker Trucks), shapes laminados com lixas e rolamentos de precisão. As manobras íam surgindo a cada dia e naturalmente, e, sem nenhuma alavanca midiática ou publicitária, o skate ganhava uma popularidade impressionante. Skate parks pipocavam em todo mundo. A primeira surgiu em San Diego, CA. As mais extravagantes e perfeitas eram as americanas e européias.

A primeira pista de skate do Brasil surgia em 74, na cidade carioca de Nova Iguaçu. Em Curitiba, a primeira pista apareceu em 1976, na Praça do Redentor em frente à Sorveteria do Gaúcho. Mas o brasileiro que quisesse ter um bom skate nesta época, só um importado, pois o único fabricado por aqui era o Torlay, da Bandeirantes, um skate com rodinhas de plástico e eixos de patins, cópia fiel daqueles rústicos carrinhos de 1965.

Em 1976, uma forte estiagem assolou Los Angeles, e um racionamento de água obrigava o esvaziamento das piscinas por toda a cidade. Os skatistas encontraram nestas piscinas mais um ótimo lugar para andar e mais uma modalidade surgia: o Skate Vertical. Um pequeno garoto inventa "quase sem querer" uma manobra que tornaria quase tudo possível no mundo do skate: levitando seu carrinho nas piscinas (batendo com o pé de trás e guiando com o pé da frente), Allan Gelfand nem sonhava que seu pequeno ollie pop em transições verticais, revolucionaria as manobras e a forma de andar de skate. Alguns anos mais tarde o também pequeno Rodney Mullen, levitava seu skate em superfícies planas, ampliando ainda mais o leque de possibilidades.


Protagonistas e responsáveis por toda evolução e rápida transformação do skate, os Z-Boys marcaram época entre 75 e 79. Lendária turma de skatistas que surgiu em Dogtown, nome de uma região de poucas quadras situada entre Venice e Santa Monica. Venice, tinha sido idealizada como uma espécie de Coney Island do Oeste americano; um bairro temático (imitava Veneza) com um enorme parque de diversões (Pacific Ocean Park- P.O.P.). Abandonada e desvalorizada no final dos anos 60, a região agora chamada de Dogtown, foi adotada por hippies, surfistas rebeldes e músicos como Jim Morrison, transformando a região num mosaico de etnias, idéias e atitudes. Uma terra de ninguém, onde hippies, surfistas, piromaníacos e junkies poderiam se exceder em simbiótica desarmonia, entre os escombros do P.O.P Pier, sanatórios, liquor stores e centros de reabilitação.

Neste cenário, uma garotada working class, filhos de pais separados, surfava de manhã na praia de Venice. À tarde, se encontravam para andar de skate em frente a surf shop Zephir em Dogtown. Encantados com a evolução da garotada, os donos da Zephir (Jeff Ho, Skip Engblom e Craig Stecyk) resolveram patrocinar e formar uma equipe de skate para competir no primeiro grande campeonato americano, o Del Mar Nationals. Assim nasceu a equipe Z-Boys Skate Team. Até então, excetuando aquela turminha de Dogtown, a maioria dos skatistas andavam como nos anos 60.Neste campeonato de Del Mar, o Z-Boy Jay Adams mostrou um novo estilo e manobras inéditas. Os juízes espantados, não sabiam como julgar, os outros competidores ficaram putos e a platéia extasiada. Um artigo e um ensaio fotográfico feito por Stecyk para a revista Skateboarder, transformou os Z-Boys em heróis do dia para a noite.

"Aquelas fotos mostravam muito mais do que um cara andando de skate. Elas mostravam um estilo de vida, uma atitude, um código." (Henry Rollins)

Os Z-Boys (onze homens e uma garota, Peggy Oki) eram uma banda de punk rock sem guitarras. E antes do punk. Como bons rebeldes, não estavam em busca de fama ou fortuna. Isso veio naturalmente. O que eles queriam mesmo era andar de skate, e se fosse necessário invadiriam casas de forma ilícita, para usufruirem de suas piscinas vazias. Hoje em dia, com a explosão da mídia, seria impossível que eles durassem como uma força underground íntegra por tanto tempo.

Os Z-Boys e todos os outros skatistas daquela área quebraram barreiras no esporte e na sociedade. Em apresentações por todo o país, levaram o estilo de vida e a essência do skate ao limite máximo. Tornaram-se famosos e afortunados com 20 anos de idade. Ao mesmo tempo, invadiam a sua casa, andavam de skate na sua piscina, realizando manobras cada vez mais radicais, colocavam uma fita do Ted Nugent, Hendrix ou Led Zeppelin no seu stereo, fumavam um baseado e caíam fora. Trouxeram ao skate uma imagem de "fora-da-lei", rebelde e outsider. Mexicanos, franceses, asiáticos, negros, brancos e judeus inventando "coisas" como frontside airs e handplants. Dalí sairam nomes como Jay Adams, Stacy Peralta, Jim Muir, Tony Alva, Allen Sarlo, Bob Biniak, Wentzle Ruml, Shogo Kubo, Peggy Oki, Nathan Pratt, Chris Cahill e Paul Constantineau.

Gino, amigo desses caras, era um menino rico que estava morrendo por causa de um câncer. O pai de Gino, resolveu esvaziar a sua piscina, e convocou todos os Z-Boys para lá andarem de skate sem a preocupação de serem presos pela polícia. Chamaram a pista de Dogbowl, pois vários cachorros vagavam em volta da piscina.

"As sessions no Dogbowl entre 77 e 80 foram o auge para todos nós. Foram os anos de ouro" (Tony Alva).

Foi no Dogbowl que Alva realizou o primeiro frontside air da história. Os aéreos de Tony Alva foram o ponto de partida para uma nova era no skate. Para se ter uma idéia da importância desses caras no skate, vamos falar um pouquinho mais sobre os mais notáveis.

Tony Alva: o original, o Chuck Berry do skate. O inventor do skate vertical, o primeiro cara a realizar um aéreo, o primeiro a estruturar uma vida estritamente no skate. Hardcore, radical e estiloso. Sinônimo de invasão domiciliar para deslizar em piscinas. Proprietário de sua própria e bem sucedida marca, Alva Skateboard Company. Começou no meio dos anos 60 e continua viajando pelo mundo em demostrações e eventos.

Jay Adams: a alma, o espírito, o Little Richard do skate. Visceral e criativo, criava manobras a cada dia. Sua contribuição ao skate não tem paralelos. Começou com 6 anos de idade, junto com o surf. Seu pai, Kent Sherwood, surfista de longa data, alugava pranchas em Venice. Reconhecido como o mais talentoso Z-Boy, freqüentemente premiado e dono de uma grande legião de fãs em todo mundo. Sucumbiu às tentações de um jovem de sucesso e atualmente está preso no Hawaii, atrás das grades por uma séries de episódios com drogas.

Stacy Peralta: um dos pais do skate moderno. Foi o primeiro Z-Boy que trabalhou a sua imagem e seus lucros. Anos depois fundava junto com George Powell sua própria marca, a legendária Powell Peralta. A marca mais influente da história do skate, a marca que descobriu Tony Hawk e o patrocinou quando este tinha apenas 11 anos. Chefe e fundador da equipe Bones Brigade. Sempre ligado ao cinema, trabalhou com Steven Spielberg e revolucionou os filmes de skate com o marcante, The Bones Brigade Video Show, em 1984. Em 91 abandonou a Powell Peralta para trabalhar apenas com produção e cinema.

Jim Muir: o coração e a raiz do skate em Dogtown. Enquanto os Z-Boys competiam, Muir ficava atrás da cena, confeccionando shapes para os seus colegas. Feitos a mão, as tábuas de Muir eram as melhores, mais leves e resistentes. Em 76, começou a vender suas tábuas sob o nome de Dogtown Skateboarding, colocando a logomarca Dogtown no mercado. Desde então, dirige a empresa e pratica surf e snowboard freqüentemente. Ainda mora em Venice com seu filho de 10 anos. Seu irmão mais novo, Mike Muir, levou o nome Dogtown para o mundo da música, com a famosa banda Suicidal Tendencies.

Shogo Kubo: imigrante japonês, chegou em Venice aos 12 anos. Começou motivado por Jay Adams, que andava de skate no estacionamento da escola de judô que ambos freqüentavam. Atualmente mora no Havaii, onde pratica surf longboard. Voltou ao skate a poucos anos atrás, inclusive assinando um model para a Bull Dog Skates.

Allen Sarlo: terceiro lugar em slalom no Del Mar Skate Nationals. Aos 16 anos, como membro do Jeff Ho Surf Team, conseguiu a façanha de vencer o lendário campeonato de surf Malibu 4-A. Atualmente, um surfista big rider de primeira, competindo no Master Quicksilver Pro-Tour. Surfa todo dia; anda de skate na rampa que construiu no quintal de casa, quando o mar está pequeno.

Craig Stecyk: mentor da equipe Z-Boys. Fundador da Jeff Ho and Zephir Productions Surf Shop. Pintor, fotógrafo e jornalista. Grafitando e pintando shapes, seu traçado marcou a estética surf/skate. Desenhou a famosa logomarca das
rodas Rat Bones.

Não posso deixar de recomendar o filme: Dogtown & Z-Boys. Premiado como o melhor documentário do Festival de Sundance de 2001, o filme foi dirigido por Stacy Peralta. Retrospectiva completa sobre a época por meio de imagens originais feitas em Super 8 e entrevistas atuais. Narrado pelo ator Sean Penn, o documentário de uma hora e meia ainda conta com depoimentos de músicos como o black flag Henry Rollins, Ian MacKaye (Fugazi) e Jeff Ament do Pearl Jam. Sucesso nos cinemas americanos, aqui no Brasil ficou em cartaz apenas na 26ª Mostra BR de Cinema de SP, em outubro. Torcemos para que em breve apareça pelo menos nas video locadoras.

Outro biscoito fino sobre Dogtown e os Z-Boys, vem de um dos melhores fotógrafos de todos os tempos: Glen E. Friedman. Glen começou a fotografar a cena de Dogtown em 1974. Aos 14 anos, se tornou colaborador da Skateboarder Magazine. Também documentou o início do hardcore americano no final dos anos 70 e as raízes do Rap no meio dos 80. Trabalhou com muitas bandas importantes como Dead Kennedys, Suicidal Tendencies, Misfits, Fugazi, Beastie Boys e Run DMC. Glen compilou seus 25 anos de carreira no skate e na música, em dois livros: Fuck You Heroes (94) e Fuck You Too (96). Além de colaborar com o documentário, Glen lançou o livro: "Dogtown - The Legend Of The Z-BOYS", seu trabalho mais recente.

Like A Method Air Into The Mosh Pit

Os anos 80 começam com Eddie Elguera inventando manobras complicadíssimas e linhas consecutivas no vertical, e com Mark Mothersbaugh, vocalista do DEVO, gravando o clip da música Freedom Of Choice dentro de uma pista de skate. O esporte estava ficando grande, muitas marcas especializadas, muitos campeonatos, muita grana rolando. O skate não estava mais tão vinculado ao surf como na época dos Z-Boys, já tinha vida própria, já tinha um estilo, uma atitude, um tipo de roupa e um tipo de música preferida.

Skatistas gostavam de punk/hardcore e punk rockers andavam de sk8 4 fun; esta simbiose estreitava os laços do esporte com bandas como Agent Orange, Adolescents, Bad Brains, Fear, Big Boys, Social Distortion, Misfits, Beastie Boys, Black Flag ou Minor Threat. Os nomes mais populares do skate desta época eram os atletas patrocinados pela Powell Peralta e a equipe Bones Brigade: Tony Hawk, Steve Caballero, Lance Mountain e Mike Mcgill no vertical, Tommy Guerrero no street style e Rodney Mullen e o suéco Per Welinder no freestyle. Outros atletas também merecem destaque como Jeff Phillips, Chris Miller, Tony Magnusson e Christian Hosoi. Observe que a maioria dos notáveis desta época, eram skatistas da modalidade vertical.

A relação do skate com o punk rock se estreitou ao longo da década. Em 1981, Tommy Guerrero e seu irmão Tony formam uma banda, Free Beer, em San Jose. Nesta mesma cidade em 82, Steve Caballero monta a sua, The Faction. Em 83, o irmão mais novo do lendário Z-Boy Jim "Dogtown" Muir, Mike Muir, lança o primeiro disco de sua banda,Suicidal Tendencies, o video da música Institutionalized mostrava pela primeira vez o skate na MTV. Também em 83, uma banda de Oxnard, chamada Agression, lançava o maravilhoso álbum Don't Be Mistaken. Na capa uma foto de Glen E. Friedman, e um cara andando de skate, na letra da música Intense Energy, um relato de uma pool skate session. Tony Alva tira a poeira de seu encostado contra-baixo, recruta Mike Ball (ex-guitarrista da primeira formação do Suicidal Tendencies) e monta a banda Skoundrelz.

No Texas, um bando de moleques skatistas formam o JFA, a primeira banda que se auto-proclamou skate rock. Mas o gênero teve seu batismo oficial apenas quando o fotógrafo da revista Thrasher, Morizen Foche (MoFo, vocalista do Drunk Injuns), organizou a primeira compilação da Thrasher Magazine em 83. A Thrasher, fundada em janeiro de 81, já tinha consolidado a imagem rebelde, contestadora e "skate and destroy". Lançando uma fita cassete por ano, a revista divulgava para seus leitores as bandas que de uma forma ou de outra tinham a ver com o skate. Thrasher Skate Rock Vol 1 - é um clássico. Abria com Los Olvidados, Big Boys, Riot 303 e Minus One. Faction, Skoundrelz, Drunk Injuns, JFA e Black Athletes completavam a fita. Uma ou duas músicas de cada banda, sendo a maioria delas da California, com destaque para as bandas de San Jose.

O Volume 2 seguia a mesma linha, abrindo com McRad e TSOL. Free Beer aparecia entre outras bandas menos conhecidas. Faction, JFA, Los "O", Big Boys e Drunk Injuns davam as caras novamente. A terceira fita, trazia bandas mais crossover (em alta, na época) como Boneless Ones, Christ On Parade, Septic Death, Corrosion Of Conformity, Accused e Gang Green.

A partir da quarta compilação, em 1986, a seleção musical apareceu de forma mais eclética. Apareceram nomes como Skate Master Tate e Tupelo Chain Sex. Steve Caballero aparecia, desta vez em projeto solo. Este ecletismo do skate rock, nada mais foi do que um retrato do caminho que o skate estava tomando. Com a incorporação de manobras do freestyle, o street style crescia, as ruas foram tomadas por streeteiros, e nas ruas começava a se popularizar o hip hop, o funk e outros estilos musicais. Assim mesmo, em todas as compilações posteriores, o punk/hardcore era o carro chefe.

O quinto volume abria com SNFU. Stupids, Dehumanizers e novamente o JFA também marcavam presença. A turma de Venice trazia Excel, Beowulf e No Mercy. Steve Alba mostrava sua banda, Screamin' Lord & His Heavy Friends. A cada ano, uma nova fitinha e bandas como Bad Religion, Sheer Terror, Samiam, D.I., Funk Face, Uniforme Choice, Bad Mutha Gooze, Insted, Wrecking Crew, Curious George, Verbal Abuse, Less Is Moore, Odd Numbers, etc etc etc.

Em 1993, o 11º e último volume, trazia Sick Of It All, C.O.C., All You Can Eat, NOFX, Youth Gone Mad, BNU, Lag Wagon, Accused e Fudge Tunnel. A fita cassete já não era tão popular, o formato compact disc chegava com tudo; CDs de hip hop embalavam rotinas de campeonatos de street.

Nos anos 90, o skate ficou mais técnico. O street continuou em alta e o skate vertical se reciclou. Se antigamente, quase todas as bandas do hardcore americano faziam parte da comunidade do skate, agora não existia mais o gênero skate rock de forma tão emblemática. A turma do street, mais eclética, era embalada pelo rap, reggae, punk e até música gospel.

A turma do vertical ainda prefiria o hardcore, mesmo em sua forma mais inofensiva, o melódico. A Thrasher ainda era uma referência, mas a revista Big Brother (do polêmico Larry Flint) foi a que mais inovou. Assim como o brasileiro Bob Burnquist, o melhor skatista da atualidade, o rei do switchstance (não existe mais frente ou costas, as manobras são realizadas com a base trocada também) recusando patrocinio milionário da Nike, pois a marca só chegou quando o esporte já estava grande. Hoje o skate é o quinto esporte dos E.U.A. São novos tempos, há pouco espaço para aquela ingenuidade dos Z-Boys ou para a "Death or Glory" da turma dos anos 80.

Tony Hawk continua apavorando em cima do skate ou fora dele. Tommy Guerrero, longe dos tempos de Free Beer, agora é músico de jazz/pós rock, com relativo sucesso no Japão. Seu álbum Little Bit Of Something foi lançado no Brasil, estou ouvindo neste momento, recomendo. Steve Caballero, sempre ativo no skate e no rock, continua tocando guitarra no The Faction. Jeff Phillips se suicidou (a banda argentina Fun People fez uma música em sua homenagem). Mark Gator Rogowski, virou fanático religioso e depois matou a melhor amiga da namorada em 92, só sái da prisão em 2010. Christian Hosoi, também está preso (de setembro de 2001 até começo de 2007) por tráfico de drogas.

Go For It

"Ah, a tristeza de saber, no fim da leitura de certos livros, que nunca mais os leremos pela primeira vez, que não se repetirá jamais a sensação da primeira leitura".

Transporto esta frase para o skate e para a música, e penso que nunca mais sentirei aquele "clic inside" igual aquele que senti quando ouví Ramones It's Alive ou Buzzcocks Singles Going Steady pela primeira vez. Nunca mais ficarei bêbado da mais pura euforia, a euforia infantil, de deslizar em um skate pela primeira vez, dentro da loja Tom Brasil (Nilo Cairo, 300) aos 13 anos de idade.Algumas sessions no Jardim Ambiental eram embaladas pelo som stereo que o Maguila (dono da Maha) levava. A primeira vez que ouvi Suicidal Tendencies, Agent Orange foi lá. Eu, o Guinalda íamos na Maha e tinha um poster do Suicidal Join The Army estourando na parede.

Mas o ponto alto de tudo isso, era o campeonato que a Maha realizava uma vez por ano no Ambiental. Toy Dolls, Dead Kennedys, TSOL, Misfits, PIL, Oingo Boingo, go for itizando os "semi-prós" Maguila e seus judo airs com cross bones azuis, Pepeu e seus smith grinds de front com bullets 66 amarelas, Franco e seus lien airs, Catarina e seus inverts, Márcio Cabalero e seus boardslides.

Piolho e Misael aprendiam suas primeiras manobras. Marcelo Kosake já se destacava entre os amadores. Tudo com muito estilo na pista, as belas amigas da sua irmã mais velha nas arquibancadas e uns piás como eu, o Guinalda, o Rodrigo "No Milk Today" Minduin, o Pança, o Joãozinho, o Osiris e o Josu, se sentindo no paraíso.

O skate no Brasil se popularizou no meio dos anos 80. Toda cultura do skate nacional era importada dos E.U.A. As marcas brasileiras eram as gringas chupadas, o tênis Mad Rats era cópia descarada do Vans... Mesmo assim foi uma fase muito legal. O skate brasileiro superou o plano Collor, superou o prefeito Jânio Quadros proibindo o skate nas ruas de S.P. em 89, superou o fim das revistas Yeah! e Overall, sobreviveu, cresceu e hoje é campeão do Mundo.

A Overall Skate Magazine, da editora TRIP, sempre produzia algo interessante. A minha capa predileta é a da edição 17 (Set 89) com a Silvia Rossi fotografada no quarto do Mureta. A Overall era comandada pelo editor Paulo Lima, pelo César Girão (atualmente da Revista Tribo), Cesinha Chaves, Formiga, Daniel Bourqui (hoje fotógrafo renomado nos E.U.A.), entre outros. Alguns destes, lançaram recentemente o livro A Onda Dura - 3 Décadas de Skate no Brasil. Confira.

Hoje a piazada compra a excelente revista do Alê Vianna, a 100% Skatemag e na seção de som, lê coisas escritas por quem realmente conhece, como o skatista e músico César Lost. Skate Rock como gênero musical no Brasil, praticamente não existiu. Para não passar em branco podemos falar do Coquetel Molotov, primeira banda punk do R.J. com o freestyler Lúcio Flávio. Em S.P. apareceu o Necrópole (tocando Intense Energy do Agression, no programa Boca Livre do Kid Vinil - Tv Cultura - às segundas, 20h - lá pelos idos de 1989) e o Grinders.

Mas na verdade a garotada ouvia o que estava sendo lançado na época ou o que o Bolota, o Arthur Verissimo, a Cecília Mãe e o Guto Jimenez escreviam na Yeah! ou na Overall. Então tinha de tudo: The Cure, TSOL, Circle Jerks, Adolescents, Toy Dolls, Metallica, Public Enemy, The Smiths, Sepultura, Ratos de Porão, The Cult, umas coisas góticas, uns reggaes.

No começo dos anos 80, a reputação dos skatistas estado-unidenses como arruaceiros e encrenqueiros estava crescendo; assim como um outro fenômeno cultural: o punk rock/hardcore. O novo som se engrenava perfeitamente com a atitude do skate. Em ambos, as regras eram claras: "There are no rules". Uma simbiose perfeita, um não se separava do outro.

A cidade de San Jose, ao norte da Califórnia, sempre teve uma extensa e rica história no skate. De lá surgiram profissionais como Jeff Kendall, Mike Prosenko, John Fabriquer, Corey O'Brien (que começou a Sonic Skateboards com seu irmão Gavin) e, é claro, o lendário e ainda atuante Steve Caballero.E foi neste cenário que surgiu o melhor exemplo desta conexão entre o punk e o skate, conhecido como skate rock: The Faction, tendo na formação os já supra citados Steve (contra-baixo) e Gavin (vocal). A banda foi formada na pista do quintal da casa de Steve Caballero, no Halloween de 1982. O primeiro show foi no dia 3 de dezembro, abrindo para o Social Distortion. Nos anos seguintes, lançam dois compactos, um EP, participam das coletâneas da Thrasher e fazem a primeira tour pelos EUA.

Em 85, recrutam (o ex-baixista do Los Olvidados e Drunk Injuns) Ray Stevens II, com Steve Caballero assumindo a segunda guitarra e lançam seu trabalho mais clássico e inspirado, o EP "Dark Room". Depois outro EP, "Epitaph". No Halloween de 85, a banda acaba, num show em San Jose, abrindo para o Hüsker Dü. Em 89, se reúnem para fazer apenas dois shows, contando com o skatista profissional Jeff Kendall no lugar do guitarrista Adam Segal.

No meio de 2001, inspirados pela volta dos Los Olvidados, o The Faction também resolve se reunir novamente. Desde então fazem shows esporádicos na região de San Jose ou em eventos e campeonatos. A formação atual é: Steve Caballero (rhythm guitar), Ray Stevens II (bass), Gavin O'Brien (vocals), Russ Wright (guitar) e Keith Rendon (drums). Já gravaram uma demo com 4 novas músicas e neste ano um novo disco pode surgir, seguindo a linha do EP "Dark Room".

Sugiro a compilação "The Faction Collection 1982-1985" e outra coletânea intitulada "Bandology - vol 1", que dá uma boa circulada por toda a carreira musical de Steve Caballero, com fotos clássicas e palavras sobre a história do skate rock. Inspirado por Stacy Peralta e Eddie Elguera, Steve teve seu primeiro contato com o skate em 1976, aos 11 anos. Famoso pelo seu pescoço torto (devido a uma escoliose), aos 16 anos já se destacava como um dos melhores skatistas de San Jose. Venceu ou foi finalista da maioria dos campeonatos mundiais do início dos anos 80. De 82 até 85 tocou na banda The Faction. Depois integrou as bandas Odd Man Out (87-8, Shovelhead (91-94) e Soda (95-96). Atualmente se diverte com o retorno do Faction, se dedica seriamente a evoluir no street style e é um dos skatistas da velha escola, mais requisitados em eventos como o Old School Skate Jam.

Assim como os old schoolers do skate foram valorizados novamente, o mesmo aconteceu com o skate rock, que nos últimos anos foi resgatado da eterna obscuridade. A gravadora Alternative Tentacles lançou no meio de 2002, três álbuns - com bandas importantíssimas, mas que nunca tiveram registrados seus trabalhos da forma merecida - que sintetizam este resgate histórico do skate rock:

Free Beer - "The Only Beer That Matters" - coletânea com músicas da primeira banda dos irmãos Tommy e Tony Guerrero;

Los Olvidados - "Listen To This" - banda de San Jose, altamente influenciada pela primeira onda do punk (Dead Boys, Radio Birdman, Saints). Na ativa entre 80 e 83, podem ser considerados o TSOL ou Agent Orange ou Adolescents do norte da Califórnia;

Drunk Injuns - "From Where The Sun Now Stands I Will Fight No More, Forever" - o terceiro lançamento da Skate-Punk series da Alternative Tentacles. A mais misteriosa e instigante banda da turma. Circa 83-84. O supra sumo do lado gothic do skate rock. Confira abaixo o nome de algumas bandas clássicas do skate rock que já foram citadas ou não, ou bandas que de uma forma ou de outra têm alguma relação com o skate:

Agression - a minha banda favorita do skate rock, o álbum "Don't Be Mistaken" está entre os meus Top 20.

U.S. Bombs - banda do old school Duane Peters. Skatista clássico, que inclusive participou das gravações do vídeo da música Freedom Of Choice do DEVO. Após anos de abuso de drogas, Peters está mais limpo e ativo do que nunca, sua outra banda, The Hunns também merece ser citada.

2 Cents Worth - com Adam Segal, ex-The Faction.

The Clay Wheels - outra banda do Ray Stevens II.

ILL Repute, Agent Orange, Big Boys, Bonelles Ones, JFA, Die Kreuzen, Odd Numbers (mod + san jose skate rock style !!! - muito bom), Stalag 13, TSOL (Flowers By The Door, tema de abertura do programa Grito da Rua), Suicidal Tendencies, DEVO, Circle Jerks, Drunk Injuns, Spermbirds, Minor Threat, D.I., Skoundrelz, Skatemaster Tate And The Concrete Crew (skate funk puro), Monkeywrench (com membros do Mudhoney), Free Beer, Los Olvidados, SNFU, Beastie Boys, Millencolin (com model de tênis pela Vans), Adolescents, Fu Manchu (stoner rock com capa de álbum com photo by Glen Friedman), Life Sentence (banda muito phoda, com apenas um registro fonográfico), McRad, Minus One, Tommy Guerrero, Stupids, Token Entry, Screaming Lord Salba, R.K.L., etc etc etc...

Um comentário:

Unknown disse...

Excelente post! Meus parabéns!!

Sobre o Skate Rock no Brasil, mais especificamente na cidade de Porto Alegre /RS, gostaria de destacar a banda Noise Grind, criada por skatistas nos anos 90, embalou varios campeonatos e abriu shows de bandas importantes da época.

http://www.myspace.com/noisegrind