A campanha de grande parte da mídia para denegrir toda e qualquer ação do governo Lula está levando até mesmo articulistas tidos como equilibrados ao desvio do jornalismo panfletário e, pior, preconceituoso. É o caso do sr. Gilberto Dimenstein, da Folha de S. Paulo, que criticou o “Vale Cultura”, lançado na última quinta-feira, em São Paulo, pelo presidente Lula.
No final de semana, ele gastou boa parte de sua coluna para desfilar um rosário de críticas ao “Vale Cultura”, com direito a chamada de capa do jornal destacando o risco de “desperdício” de dinheiro público. Em artigo anterior, no mesmo jornal, Dimenstein já havia dito que tinha receio de que “com esses R$ 800 milhões se estimule, com dinheiro público, acesso à cultura exclusivamente comercial”.
Neste novo artigo, ele aprofunda seu argumento de que o dinheiro seria melhor utilizado para estimular a presença de público em eventos já existentes, que seriam gratuitos e pouco frequentados. Diante da observação anterior, imagina-se que os tais eventos seriam, por exemplo, as exposições do Masp, na Avenida Paulista, ou algum outro santuário da “verdadeira” cultura não comercial.
Na verdade, em nome de atacar a iniciativa do governo, o “vale tudo” da mídia faz boa parte da crítica perder-se em uma linha de argumentação com um tal grau de elitismo, hipocrisia e preconceito que remete a outras épocas da história recente da humanidade. Durante anos, décadas, com raras exceções, a mídia nacional tratou a cultura em geral como um assunto de elite - rica, claro, branca, sob influência imperial européia e, depois, americana, e de costas para a América Latina.
Talvez por isso seja tão difícil aceitar que o povo - que ainda tem a liberdade de escolha! - vá gastar “dinheiro público” para assistir um show de Vitor & Léo, um filme de atores globais ou comprar um livro de auto-ajuda. Mas, como disse um amigo artista, o importante de tudo isso, no mínimo, é que as pessoas, em milhares de casos, entrarão em um teatro pela primeira na vida, ou comprarão um livro para ler.
Nunca é demais lembrar que, atualmente, devido a inclusão cultural proporcionada pela internet, a cena independente nacional floresceu principalmente fora dos grandes centros urbanos e nos subúrbios do país. Aliás, um tema que também mereceu a crítica do mesmo jornal por conta do apoio público aos festivais, como se isso fosse um "crime", e não um dever do Estado para com a sociedade.
A crítica ao “Vale Cultura”, em última instância, é a mesma que fazem ao “Bolsa Família”, compreensível para quem ainda não aceita a emergência social de uma ampla massa de brasileiros. Se antes erraram quando afirmaram que o dinheiro para comida estimularia a vagabundagem, agora devem morrer de medo de entrar em um teatro e encontrar um pobre sentado ao seu lado. E o mais divertido, em uma peça de Shakespeare.
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